sexta-feira, 30 de abril de 2010

Coco avant Chanel


Esse post leva o nome do filme de Anne Fontaine sobre a vida da estilista que transformou a moda do século XX livrando as mulheres dos tais corseletes e de todas aquelas roupas terríveis que mais pareciam bolos de casamento. A poderosa Chanel não é retratada no filme; ao contrário do que se pensa, e como mostra o título, o que é posto em cena é a vida da orfã que costurava de dia e cantava nos cabarés franceses a noite. Uma menina séria, tímida e instrospectiva que fazia questão de se vestir como os homens da época. A frase que se repete no filme é: " Vou soltar esse vestido pra você se movimentar melhor" ou "eu tiraria esse arranjo, muito carnavalesco". Coco estava sempre de calça, camisa e com um chapéu bem masculino; fora que o sobretudo aparece sempre....tá, eu tenho uma "queda" por sobretudo....vou parar com isso...rs


Quanto à atuação de Audrey Tautou, sou suspeita para falar,ainda mais depois de Amélie Poulain (que consta no meu top 10). Acabei sendo levada a gostar de todas as protagonistas feitas por ela. Tautou possui uma sensibilidade incrível. Críticas a parte (e pode-se mesmo dizer que Chanel não foi tão bem feita como, por exemplo, Piaf em La Môme) Tautou conseguiu manter-se de testa enrugada e com o cigarro na boca, habitos típicos da estilista. Além do mais, como bem coloca a crítica do http://omelete.com.br/cinema/critica-coco-antes-de-chanel, "o filme não coloca o envolvimento de Chanel com nazistas, o que lhe rendeu uma prisão por crimes de guerra, um exílio de uma década e o ódio dos franceses. Tudo isso vai para sob o tapete, e a biografia da estilista ganha, cada vez mais, ares de história da carochinha. Uma carochinha muito bem vestida, aliás."
Pois bem, roupas incríveis (eu bem queria um dos vestidos e, claro, o sobretudo....rsrs), Tautou bem, mas nem tanto; não foi para fazer uma crítica cinematográfica que decidi escrever...
Além dos filmes dos anos 60 e dos filmes sobre os anos 60, me interessa bastante a vida dessas grandes mulheres que a história nos dá. Chanel foi uma delas e, durante o filme, assim como quando vi a obra sobre a vida da grande Edith Piaf, fiquei pensando no perfil dessas "divas".
Geralmente, uma mulher bem sucedida em sua vida profissional abre mão de viver um grande amor. No caso de Chanel isso é visível, ela nunca se casou (e não estou dizendo que casamento é sinônimo de amor bem sucedido, aliás, penso que seja o contrário, mas o casamento é algo bem discutido no filme ) e, vez ou outra dizia: "o melhor do amor é fazer amor, pena que precisa-se de um cara pra isso". Piaf também era bem avessa às "aventuras amorosas" e ao comportametno masculino, talvez por não ter uma boa e consistente imagem do "pai" (pode ser que Freud o explique, eu não farei isso aqui).
Nas duas histórias, elas eram as amantes da relação e o único grande amor vivído por elas é perdido de forma trágica, num acidente.
Podia até ser um cena de ficção, não? Mas não é...
O filme também trás outras "questões de gênero", por exemplo, a companheira de Coco, que sonhava se casar com um dos barões da história e que não é apresentada a família do rapaz; a própria Coco vive uma relação de submissão com Étienne Balsan, homem que ela conheceu na noite parisiense, que nunca gostou nem aceitou seu jeito de ser e se vestir, jeito esse usado para a diversão da "bourgeoisie parisienne" frequentadora da casa de Balsan. Caso interessante de submissão este, uma vez que Coco sempre foi uma mulher independente financeiramente, o que mostra que a dependência financeira não é, muitas vezes, o que leva uma mulher a tocar uma vida submissa e limitada; poderíamos usar o habitus do Bourdieu pra argumentar sobre isso, mas o objetivo é mesmo levantar questões, sem recorrer à Acadêmia.

Mas Coco viveu essa vida por um breve período de tempo, até conseguir dinheiro para montar seu próprio ateliê....de onde vem o dinheiro? Do bolso de "Boy" Capel, o segundo homem da história, esse sim o amor de verdade. Aliás, outra frase que merece destaque nesse nosso debate de gênero é dita por ele -"eu achei que fosse te dar um brinquedo e vc transformou isso em trabalho"....idéia essa presente ainda no nosso repertório contemporâneo, lembrei quando Maluf disse que as professoras do Ensino Básico não deveriam querer ganhar mais, deveriam mudar de marido....lamentável....
Lembrei também dos meus trabalhos de campo da faculdade entrevistando mulheres que afirmavam ter sucesso profissional e pessoal e, mesmo assim, diziam sentir que faltava algo em suas vidas, esse algo era o filho, tão buscado e colocado ainda como necessário à mulher para que ela se sinta completa.....

Pois olha como um filme sobre a vida de uma mulher que viveu no início do século XX abre espaço para pensarmos questões ainda tão impregnadas em nosso imaginário atual. O casamento, ainda tão forte hoje em dia; a necessidade imposta às mulheres de que elas precisam, a todo momento, ter um homem do seu lado, mesmo que ele for um idiota (vide o bombardeio de livros de auto-ajuda destinados as solteiras, que levam títulos do tipo "Tenha sucesso profissional, mas, pelo amor de Deus, arrume um marido"); a submissão feminina que ainda se mantém e que, de forma alguma está somente vinculada ao dinheiro.

E, por fim, vale ressaltar, digo"as mulheres", porque não sinto as mesmas exigências em relação aos homens. Tá aberto o direito a defesa da ala masculina visitante do blog....por favor....rs

Beijos

Lara






quinta-feira, 29 de abril de 2010

L’étranger

Baudelaire, toujours Baudelaire....

Gosto muito dele e do poema abaixo.....coloquei o original, pois minha busca por conhecer o francês não me permitiu tacar direto a tradução.....mas em seguida lá está ela.....vale dizer que o verbo "aimer" pode ser traduzido como "gostar" ou "amar", portanto, sinta-se a vontade :-)...

"Qui Aimes-tu le mieux, homme énigmatique, dis? Ton père, ta mère, ta soeur ou ton frère?
_ Je n'ai ni père, ni mère, ni soeur, ni frère.
_Tes amis?
_Vous vous servez là d'une parole dont le sens m'est restée jusqu'à ce jour inconnu.
_Ta Patrie?
_J'ignore sous quelle latitude elle est située.
_La Beauté?
_Je l'amerais volontiers, déesse et imortelle.
_L'or?
_je le hais comme vous haïssez Dieu.
_Eh! Qu'aimes-tu donc, extraordinaire étranger ?
_J'aime les nuages...les nuages qui passent....là-bas...là-bas....les merveilheux nuages!"

"_De que você mais gosta, homem enigmático, diga? Seu pai, sua mãe, sua irmã ou seu irmão?
_Eu não tenho nem pai, nem mãe, nem irmã, nem irmão.
_Seus amigos?
_Você se serve de uma palavra cujo sentido eu desconheço, até este dia.
_Sua pátria?
_Eu ignoro qual latitude ela está situada.
_A beleza?
_Amá-la-ia de vontade, divina e imortal.
_ O ouro?
_Eu o odeio como você odeia à Deus.
_ Do que você gosta então, extraordinário estrangeiro?
_ Eu gosto das nuvens...das nuvens que passam...lá longe...lá longe....as maravilhosas nuvens!"

Bisous....

segunda-feira, 26 de abril de 2010

La nuit

Esses dias eu estava pensando de onde vem esse meu fascínio pela noite. Não tem nenhum músico, nem mesmo nenhum crupiê em minha família.Vale dizer que não falo da night das baladas sertanejas universitárias, até porque não gosto desse tipo de música e foi-se o tempo em que eu bebia um pouco para "encarar" a festa com música "ruim". E quem me conhece bem sabe que, ultimamente, não adianta insistir.
Bom, falo da noite.....essa que começa por volta das 18h30!
A noite, é tão fresca. Mesmo as noites quentes araraquarenses tornam-se suportáveis quando fico cinco minutos na mureta do quintal de casa. Agora o dia não, não há cinco minutos ao ar livre que refresquem meu cérebro, fora que a claridade em demasia deixa os olhos marejados.
Na noite as pessoas ficam tão mais interessantes. tenho a impressão de que elas falam menos e num tom de voz mais baixo, muito mais chique. Fora a roupa, se for uma noite fria, melhor, pois o charme fica garantido com um belo sobretudo, ainda mais se quem estiver vestindo for um homem; eles ficam muito bem de sobretudo, pena que não usam, nem no inverno. Você já pensou naquela cena ideial? Aquela que você sonha vivenciar um dia qualquer de vida? Pois a minha é sentada num Café Parisien (de preferência onde Simone e Sarte se encontravam pra discutir o existencialismo) de sobretudo e boina, fumando um cigarro. Mas eu nem fumo...bom, abriria uma exceção...pela noite...
A noite é silenciosa. A casa fica quieta, a vizinhança também. Até Marx, Weber e Durkheim descem melhor.
Pena que a noite não foi feita para as moças né? Sempre ouvi dizer que não é recomendável sair sozinha a noite pela rua. Talvez daí meu fascínio...é, pode ser.
Admiro as pessoas que trabalham a noite, que estudam a noite (aliás, o curso noturno é sempre muito mais interessante. Eu não tenho sono. De manhã e a tarde tenho, ainda mais depois de "bandejar", mas a noite não. E os professores dizem "o noturno é mais interessado nas aulas")
Ah, a noite....se o mundo não funcionasse de dia eu trocaria meus horários. Se a graduação não funcionasse de dia, se os bancos não abrissem de dia, se minha mãe não me acordasse de dia....ah, a noite....

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Davida


Encontrei o livro Filha, mãe, avó e puta: a história de uma mulher que decidiu ser prostituta, de Gabriela Leite por acaso, em uma das minhas visitas a Nobel de Araraquara. Minha orientadora vivia comentando a trajetória de Gabriela e uma de suas visitas a Unesp – “ela estudava na USP dos anos 60 e trabalhava num grande escritório, decidiu largar família, filha e virar prostituta”. Logo em seguida sempre acabávamos discutindo por alguns minutos um assunto sobre o qual nunca chegávamos à conclusão alguma: a prostituição necessitava ser considerada profissão como qualquer outra e, portanto, dever-se-ia tirar do Código Penal os “empregadores” das prostitutas para que eles pudessem assumir seus deveres trabalhistas para com elas (o que incluiria, por exemplo, o recolhimento de previdência social); ou olharíamos a prostituição como mais um dos exemplos de utilização e exploração do corpo feminino para o prazer do homem já que a prostituição de mulheres é muito mais recorrente. Sempre tendi ao primeiro caso.Bom, voltemos ao livro. Comprei no crédito e li em dois dias....Leitura gostosa, em primeira pessoa. Nada de alguém falando por Gabriela. Ela fala direto a nós, com direito a vários palavrões. Gabriela Silva Leite tem 59 anos, nasceu no dia 22 de abril de 1951 em São Paulo, é prostituta aposentada (sim, casada e aposentada). Baixinha que não abria mão de um salto alto, Gabriela, logo na primeira página do livro, apresenta as suas três paixões: “Adoro homens, gosto de estar com eles, e não conheço homem feio. Alimentam um amor imenso pela mãe e pelo próprio corpo. Magros ou gordos todos têm um belo corpo. Outra coisa que adoro é falar o que penso, sem papas na língua. Quem ler este livro vai perceber isso. Existe uma terceira coisa que eu prezo muito, talvez a que mais prezo, aliás, que é a liberdade, liberdade de pensar diferente, de se vestir diferente, de se comportar diferente”. Em plena efervescência dos anos 60, cursava sociologia na USP e trabalhava num grande escritório de São Paulo. Filha de uma dona de casa conservadora e de um empregado de cassinos só foi compreender e abraçar sua mãe depois de sair de casa e viver a sua vida. Freqüentadora assídua da boemia paulistana afirma que enquanto os amigos todos estavam na “pegada” das drogas, sua revolução particular passava por exercer livremente sua sexualidade.Hoje se dedica a defender a categoria e a regulamentação da profissão, coordena a ONG Davida fundada por ela em 1991 que pretende promover a cidadania das mulheres com ações nas áreas de educação, saúde, comunicação e cultura. A grife Daspu (nome inspirado na luxuosa boutique de São Paulo Daslu) gerou polêmica ao ganhar espaço na mídia e despertar o interesse internacional com seus desfiles ousados. De repente, seja possível o leitor lembrar-se dos dois blocos concedidos a Gabriela no Programa do Jô onde ela contou “sem papas na língua” os dez mandamentos da prostituta e os programas mais “diferentes” que já fez.Já o livro, impressionante! Não por se tratar de uma prostituta, aliás algo até comum em um país onde, Segundo a Fundação Mineira de Educação e Cultura (FUMEC) estima-se que haja em torno de 1,5 milhões de pessoas, entre homens e mulheres que vivem em situação de prostituição. Também, não pelo fato de Gabriela expor detalhes de seus programas alguns, nada “interessantes”, pois, ao contrário do que se pensa, vender sexo não está diretamente relacionado a ter prazer (e olha que esta mulher afirma gostar de fazer sexo). O que impressiona é justamente a decisão de largar uma vida estável para viver a prostituição. E o choque vem, pois ainda relacionamos a venda do corpo com o ganhar dinheiro, com o sustentar a família, com o tão injusto “sistema” que não aloca os indivíduos fazendo deles, como diz Bauman, o lixo da sociedade. Colocamos o sexo como mercadoria passível de ser vendido sem vinculo afetivo e, pronto, está justificada a prostituição e a figura da puta já está dada como vitima, coitada, ter que fazer isso. Gabriela não precisava de dinheiro e bem sabia que não se tratava somente disso e que o mundo dos desejos é vasto. Sabe também que as “mulheres tem um certo medo de ir a procura dos seus desejos”. Foi isso que ela fez, cansada da vida, cansada de acordar cedo, cansada das regulações familiares. Por dinheiro? Ele é bem vindo, afinal, em determinadas noites, se ganhava quase o equivalente ao mês trabalhado; mas, a principal motivação não foi essa. Um caso a parte? Não sei, nem posso saber. Mas, pra se pensar não é mesmo?Parte do que escrevi foi tirado da entrevista cedida por Gabriela ao programa Roda Viva. O Link: http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/723/entrevistados/gabriela_leite_2009.htm
Lara Facioli

Abri a conta desse blog em 2009 e só postei um texto de Clarice Lispector que, por sinal, adoro. Tentarei postar mais vezes aqui, não sempre, pois talvez não consiga adquirir o hábito de escrever com muita frequência, também por falta de tempo. Mas farei um esforço....
na verdade, a vontade voltou depois de postar no http://www.blogdocarniato.blogspot.com, um texto que estará logo acima....
O objetivo desse blog? Bom, talvez não tenha....só mesmo discutir alguns assuntos que me perturbam, que me deixam feliz, algumas provocações....essas coisas que a gente faz pela net....
abraços