domingo, 15 de agosto de 2010

Olá queridos e queridas, este blog anda mto tristão.....então, darei uma pausa nas leituras pra escrever um pouco aqui....
Sabe que esses dias, numa de minhas aventuras pela tão ruim TV brasileira, parei de vasculhar os canais quando vi que a Ruth Escobar seria homenageada na maravilhosa TV Cultura (não sei pq vasculho tanto, já que sempre termino na Cultura).
Ruth, nascida em Portugal, atriz de vanguarda e militante feminista envolvida na luta contra a ditadura, abrigava em sua casa os perseguidos políticos da época e fazia questão de levar o teatro às ruas com um ônibus que adaptou pra isso.....
Choro a parte - e chorei mesmo, ainda mais quando ouvi O Bêbado e o Equilibista na voz de Elis que cantou durante a inauguração Do Teatro Ruth Escobar em São Paulo - vim aqui pra deixar o belo poema que Ruth declamou ao final da homenagem tão bem feita pela emissora, por sua filha, por seus amigos...
Ruth merece outro post no blog, e o farei em breve....por enquanto, deixo o poema, tão grandioso quanto a atriz que o declamou....

Cântico Negro
José Maria dos Reis Pereira

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

beijos....e até logo

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